NÃO GOSTO DE VERDE E AMARELO

Nunca jurei a bandeira,

não sei a letra do hino nacional

e não torço pela seleção.

Quando criança 

jamais quiz ser soldado.

Afinal, nunca fui burro.

Cresci com opinião própria 

sobre tudo.

Tive alguma educação.

Odeio guerras e ditaduras

e não obedeço sem questionar.

Por tudo isso,

não visto e nem gosto

de verde e amarelo.

NOS TEMPOS DA DEMOCRACIA

Nos tempos, que dizem ser,

da democracia,

ninguém quer saber

como se vive,

existe ou resiste,

na periferia.

Afinal, cidadão é quem  nasceu branco,

ganha bem e ainda é  patrão.

Não quem se lasca de sol a sol

sem direito a nada

submetido a um regime de semi escravidão. 

A vida da gente nunca vira noticia.

Noticia é coisa pra gente rica

aparecer na televisão.

A gente só virá manchete

quando algum inocente 

encontra a morte na mão da polícia,

quando vira dano colateral e estatística.

É assim que acontece nos tempos,

que dizem ser, da democracia.

 

TODO PODER É MALDITO

Todo poder é maldito.

Seja ele executivo,

legislativo, judiciário 

ou divino.

Todo poder é maldito,

como todo Estado é assassino

e  sempre seremos subversivos.

LEI, ORDEM E JUSTIÇA

Apenas pretos e pobres nascem condenados a lei e a ordem.

Para os brancos e ricos

a justiça é questão de política,

jamais  caso de polícia.

É por isso que

 juiz vende sentença 

 e há tanto tráfico de influência.

A lei é só para os pretos,

a ordem é só para os pobres.

Os brancos  decidem  a  justiça.

LIBERDADE DE OPINIÃO

Na era da informação 

a classe média, branca e ilustrada,

não é mais senhora da opinião.

A opinião agora circula  pelas telas e janelas das periferias,

livre dos jargões e erudições

da academia.

Através do ciberespaço 

cada vez mais os debaixo

aprendem a pensar 

contra os de cima

e contra toda hierarquia.

A razão não é mais para poucos

em tempos de informação.

QUESTÃO DE SOBREVIVÊNCIA

Todos precisamos de um sustento.

É uma questão de sobrevivência.

Nascemos despossuidos,

condenados a empregos de merda

e salários de fome.

Assim, nos alimentamos, diariamente,

do lixo dos ricos,

dos restos da mesa dos que vivem de herança, exploração e renda.

Mas um dia a fome será  tanta

que comeremos os ricos,

também, 

por uma questão de  sobrevivência.

SOBRE O GOLPISMO DO 8 DE JANEIRO

A tentativa de golpe de Estado do 8 de janeiro é um episódio asqueroso e repugnante que revela o quanto a extrema direita é perversa, escrota e assustadoramente autoritária. 

Não se pode reduzir a um caso de aberração ideológica o planejamento perverso da execução  do presidente, vice presidente  eleitos em 2022, além de ministros do supremo demonizados pelos extremismo conservador.

Trata-se antes de tudo de um caso de autoritarismo explícito que até pouco tempo nos parecia impossível no atual cenário político tupiniquim.

Estávamos errados e o exército, enquanto instituição da ordem, está profundamente comprometido com o passado, o presente e o futuro de uma alternativa autoritária.

Não podemos minimizar o episódio, deixar de identificar e responsabilizar os envolvidos, principalmente aqueles em posição de poder e tidos como intocáveis.

É preciso combater com firmeza toda forma de autoritarismo e conspiração envolvendo a possibilidade de uma nova ditadura militar e  genocida.

Por isso é impossível normalizar o bolsonarismo. Temos ódio e nojo a ditadura, para lembrar a frase emblemática de Ulisses Guimarães, mas cabe acrescentar, mesmo que certo autoritarismo seja perpetuado pelo abstrato Estado democrático de direitos de vocação liberal.

OS BRANCOS INVENTARAM O NEGRO

Os brancos inventaram o negro

para domesticar os pretos,

naturalizando hierarquias, racismos e desigualdades,

preservando, assim, a herança maldita do cativeiro.

Os brancos inventaram o Estado nação,

o mito das três raças,

as luzes da razão branca colonialista,

para que os pretos fossem parte de um passado branco e supremacista.

Os pretos só inventaram a resistência,

a revolta, a liberdade e todos os abolicionismos na  contramão da modernidade.

NINGUÉM ACREDITA EM GOVERNANÇA GLOBAL

Ninguém acredita nas resoluções do G-20,

na globalização econômica,

na ONU, na cúpula do clima, dos povos,

ou nos tribunais internacionais.

Ninguém acredita na ordem mundial,

no capitalismo,

nas economias emergentes

ou nos donos do mundo.

Ninguém acredita em governança global.

CONTRA TODOS OS GOVERNOS

Governos não servem ao povo,

não mudam a cidade,

o Estado ou o mundo.

Governos mantém a ordem

reduzindo vidas a algoritmos,

realizam grandes negócios 

contra os interesses públicos.

Governos não são transparentes,

nem democráticos.

Não passam de arranjos oligárquicos

a serviço de  interesses obscuros.

Por tudo isso, não serviremos a nenhum governo,

seremos desde sempre desobedientes, 

ingovernáveis 

e, terrivelmente, libertários.

ACREDITO NOS INSURGENTES

Acredito nos insurgentes,

nos que não tomam a realidade

como um dado estabelecido e imutável

e nunca se calam frente a desigualdade e a injustiça.

Acredito nos que questionam, 

duvidam,

nos que se afirmam descrentes

e se voltam contra tudo que é normal e decente.