SOLIDARIEDADE E HABITAÇÃO

Não basta um teto,

um abrigo,

para habitar.

É preciso conquistar a si mesmo,

descobrir-se entre os outros,

em apoio mútuo,

ocupando um espaço,

realizando multirões,

criando um território,

que inventa  em todos

um lar.

É preciso ser solidário,

surpreender-se interdependente 

saber-se inteiro entre os outros,

para conquistar a segurança  de um chão,

transformar um lugar,

reinventando a cidade

através da luta pelo direito a habitação.

LONGA VIDA AOS QUE LUTAM CONTRA O TRABALHO

Desprezo os bons escravos

dedicados ao lar e ao trabalho.

Tenho nojo dos funcionários 

que admiram patrões, chefes supremos, bilionários  e empresários.

Apoio os que lutam por tempo livre,

os inimigos da lei, da ordem e do Estado,

que acreditam  em uma vida livre e digna.

O futuro começa aqui e agora

na contramão da escravidão do trabalho.

Todo labor deve ser lúdico,

toda riqueza repartida entre os produtores.

todo existir deve ser libertário.

POR UMA GRANDE REVOLTA CONTRACOLONIAL

Nestas terras atlânticas, Indígenas e negros resistem por séculos 

ao domínio colonial.

Sobrevivem  a supremacia branca 

e a modernidade como projeto nacional.

Talvez, um dia, indígenas e negros façam juntos, no novo mundo,  uma grande revolta

libertando todo continente do peso da história ocidental.

NESTAS TERRAS DITAS OCIDENTAIS

Nestas terras ditas ocidentais,

a cidadania ainda é censitaria

apesar do sufrágio universal.

Pois, a República é para poucos,

brancos, machos, proprietários. 

Os demais, são os outros,

condenados a tutela do Estado e

a indignidade de um trabalho.

Nestas terras ditas ocidentais,

a população, reduzida a gado,

anda bem longe de se tornar um povo.

A RUA E A MARGEM

A rua é do povo, dos excluídos,

dos  inclassificáveis, dos fodidos,

dos descontentes, dos alegres,

dos resistentes e insurgentes.

A rua é o avesso dos palácios,

parlamentos e outras faces do Estado.

É onde a sociedade  respira contra o poder,

é onde enfrentamos a ordem e seus soldados.

A rua é a veia do desejo mais delinquente que existe.

O IMPERATIVO INSURGENTE

A margem da ordem vigente

alguém  sempre dançará  insolente 

 uma antiga e bela canção  delinquente.

Contra todo autoritarismo e desigualdade 

sempre existirão aqueles que dizem não.

Os que exigem uma solução do tamanho de uma revolução

para as dores dos povos e problemas do mundo.

 Existirá sempre no peito dos despossuidos, a intempestiva inspiração de um levante,

 de uma vontade ancestral e insurgente

contra o tempo e a razão da época vigente.

Haverá sempre entre os inconformados o vislumbre de uma grande transformação mais do que necessária e  urgente

contra o crepúsculo da civilização.

ENTRE A ESTUPIDEZ TRUCULENTA E O OPORTUNISMO GROSSEIRO

O que inspira o rebanho da estupidez é, em primeiro lugar, o autoritarismo. O prazer do mando e da obediência. O culto a tirania e o prazer da submissão é também uma defesa da desigualdade e da exploração de classe. Não  há como separar uma coisa da outra. 

No fundo, tudo se resume em  estabelecer ou manter privilégios e hierarquias. Não importa se as custas do bem comum.

 Os defensores do autoritarismo ambicionam sempre alguma vantagem, algum ganho perversamente egoísta. Nunca é apenas uma  questão de simples ideologia, truculência ou caricata ignorância. A dicotomia entre dirigentes e dirigidos assenta-se na diferença entre os que tem tudo e os que nada tem.

CORRUPÇÃO ESTRUTURAL

A corrupção é inerente as instituições modernas,

a cultura republicana e racista,

que nos reduz a população 

administrada e domesticada  pelo Estado.

A corrupção existirá enquanto for natural

a existência de dirigentes e dirigidos,

dominantes e dominados,

para a prosperidade de alguns poucos privilegiados.

A corrupção é a essência da acumulação capilatista,

que justifica a afirmação da autoridade, 

da hierarquia e do lucro desenfreado.

OS MANSOS INDIGNADOS DOS PROTESTOS BEM COMPORTADOS

Os mansos indignados dos protestos bem comportados

ganham as redes sociais e as ruas, em dias de feriado.

Defendem a democracia,

a economia, os santos, orixás e, até  mesmo, os policiais e o Estado.

Fazem procissão, notas de repúdio e abaixo assinados, por qualquer boa causa,

são quase todos brancos, de classe média, muito bem informados e remunerados.

Os mansos indignados dos protestos bem comportados

amam a ordem, o poder, o sufragio,

 o progresso e seu bom ordenado.

Não querem saber de revolução,rebelião,

 e abominam a truculência de um tal de proletariado.

A ANARQUIA COMO DEVIR CRIADOR

A anarquia é a ordem ditada

pelo devir da vida,

que nega a autoridade dos dominantes

 e  exausta a revolta dos dominados.

A anarquia é a trincheira da imaginação,

 da ação criadora, das práticas de  liberdade.

Ela é a grande vontade de mundo

 que supera  eurocentrismos, racismos, modernidades e colonialidades.

Ela é um cuidado de si e dos outros, 

uma contra cultura e crítica do presente, 

da cidade, da igreja e do Estado,

que, através  da natureza,

supera toda ilusão de humanidade.

O MUNDO QUE VIRA NOTÍCIA

O mundo que vira notícia

não é o mesmo em que vivo

Mas aquele que me nega como indivíduo,

que me reduz a força de trabalho e

a um conjunto de dados digitalizados.

O mundo que vira notícia 

é o do político, do empresário,

e do deficit primário.

É um mundo deteriorado,

triste e devastado.

Não é o mundo das periferias,

dos loucos, crianças e carbonários,

onde os fatos seguem na contramão do notíciario.